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Pré-condicionamento Isquêmico Remoto em Cirurgias Cardíacas: Qual é o Nosso Avanço?”

A cirurgia de revascularização do miocárdio sob circulação extracorpórea (CEC) pode induzir lesão isquêmica em todo o corpo, mas especialmente nos rins. A lesão renal aguda ocorre em até um terço dos pacientes submetidos à CEC. Acredita-se que a insuficiência renal pós-revascularização seja resultado de lesão de isquemia-reperfusão, quando o suprimento de oxigênio para um tecido é interrompido e depois restaurado. Estudos em animais sugeriram que o corpo poderia ser preparado ou treinado para suportar melhor a lesão de isquemia-reperfusão, induzindo isquemia leve em outro leito de tecido antes da operação. O mecanismo pelo qual isso aconteceria não está claro.
No método mais comumente testado, a anestesia é induzida e um manguito de pressão arterial é inflado para ocluir o fluxo sanguíneo em um membro por cinco minutos ou mais, seguido por cinco minutos de reperfusão, repetidos por um total de três ou quatro ciclos. A cirurgia é então realizada. Vários ensaios clínicos randomizados testaram essa manobra, chamada pré-condicionamento isquêmico remoto (PCIR).
No estudo RenalRIPC, pesquisadores de quatro hospitais na Alemanha randomizaram 240 pacientes planejados para cirurgia cardíaca que estavam em alto risco de lesão renal aguda em 2013 e 2014 para receber PCIR ou PCIR simulado (controle). Os pacientes receberam o PCIR após a indução da anestesia e antes da incisão inicial. Após 30 dias, a lesão renal aguda foi significativamente reduzida no grupo de PCIR (37,5% vs. 52,5%, uma redução de risco absoluto de 15%, número necessário para tratar de 7). A necessidade de terapia de substituição renal também foi menor no grupo de PCIR (5,8% vs. 15,8%, redução de risco absoluto de 10%, número necessário para tratar de 10). Os pacientes deixaram a UTI um dia antes (mediana 3 vs 4 dias). A mortalidade não foi reduzida.
Outro estudo chinês (Zhonghshan Trial) randomizou 509 pacientes com alto risco de insuficiência renal aguda que seriam submetidos a cirurgia cardíaca eletiva em um único centro na China para receber PCIR ou um procedimento simulado 24 horas antes da cirurgia. Em 7 dias de acompanhamento, menos pacientes que receberam PCIR apresentaram insuficiência renal aguda (27,2% vs 35,3%, redução de risco absoluto de 8%). O que pode ser a diferença mais interessante entre esses dois estudos é que no estudo chinês de centro único, nenhuma sedação ou anestesia é descrita para a manobra de PCIR, que ocorreu 24 horas antes da cirurgia (em oposição a imediatamente antes da incisão). Em outras palavras, quinhentos chineses aparentemente concordaram em ter seus braços dolorosamente contraídos e soltos por um período de 30 minutos, apenas para participar de um estudo de pesquisa para uma terapia não comprovada. Este é um exemplo notável das diferenças entre condutas e sociedades, que podem influenciar os processos de ensaios clínicos e seus resultados.

Cabe ressaltar que outros ensaios clínicos randomizados que testaram o PCIR não encontraram benefícios na melhoria dos desfechos cardiovasculares compostos após cirurgia cardíaca. Ensaios randomizados menores também foram conflitantes.  Uma grande metanálise concluiu que o PCIR melhora a IRA em 2% absolutos após cirurgia cardíaca (número necessário para tratar, 50). Os benefícios ocorreram principalmente em pacientes que receberam anestesia volátil. Acredita-se que o propofol iniba os efeitos benéficos do RIPC.

Como conclusão, até o momento, os dados da literatura sugerem que o PCIR (por exemplo, oclusão do fluxo sanguíneo em um braço por três períodos de cinco minutos antes de uma cirurgia cardíaca) reduziu a taxa de lesão renal aguda no pós-operatório em alguns ensaios clínicos randomizados.

Por:

Giulliano Gardenghi

  • Coordenador científico da Faculdade CEAFI
  • Gestor do Grupo da Central da Reabilitação
  • Coordenador científico da Hospital ENCORE
  • Membro do Heart Team da Cirurgia cardíaca do Hospital ENCORE

 

Referências

  • Jia P, Ji Q, Zou Z, Zeng Q, Ren T, Chen W, Yan Z, Shen D, Li Y, Peng F, Su Y, Xu J, Shen B, Luo Z, Wang C, Ding X. Effect of Delayed Remote Ischemic Preconditioning on Acute Kidney Injury and Outcomes in Patients Undergoing Cardiac Surgery: A Randomized Clinical Trial. Circulation. 2024 Sep 25. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.124.071408. Epub ahead of print. PMID: 39319450.
  • Zarbock A, Schmidt C, Van Aken H, Wempe C, Martens S, Zahn PK, Wolf B, Goebel U, Schwer CI, Rosenberger P, Haeberle H, Görlich D, Kellum JA, Meersch M; RenalRIPC Investigators. Effect of remote ischemic preconditioning on kidney injury among high-risk patients undergoing cardiac surgery: a randomized clinical trial. JAMA. 2015 Jun 2;313(21):2133-41. doi: 10.1001/jama.2015.4189. PMID: 26024502.
  • Long YQ, Feng XM, Shan XS, Chen QC, Xia Z, Ji FH, Liu H, Peng K. Remote Ischemic Preconditioning Reduces Acute Kidney Injury After Cardiac Surgery: A Systematic Review and Meta-analysis of Randomized Controlled Trials. Anesth Analg. 2022 Mar 1;134(3):592-605. doi: 10.1213/ANE.0000000000005804. PMID: 34748518.
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